(...), nos arredores de Abrantes, num largo à saída da Estrada Velha, quando está entronca com a Estrada Nova, a caminho de Alvega, há uma pequena capela, propriedade particular, sempre fechada a sete chaves, conhecida como do culto do Senhor dos Aflitos. Esmolas de azeite e em dinheiro afluem com cerca regularidade e muita devoção. E a lenda não terá ainda um par de séculos. Pois diz-me que um homem dessa família (...) passando a cavalo e com a sua matilha por aquele lugar foi assaltado por uma alcateia. Os lobos seriam muitos e esfaimados, a ponto de terem acabado com os cães do viajante. Este, impotente para enfrentar as feras, apelou ao Senhor dos Aflitos e a alcateia afastou-se, deixando-o incólume. Emocionado e grato, o cavaleiro logo ali mandou erguer aquele templozinho. (...) Diz o povo que as gentes com problemas nos negócios, dinheiro, mas também de saúde e de amor - Aflitos de um modo geral! - ali acorrem a fazer e a pagar as suas promessas. Falámos em Alvega, e vamos agora a Areia - Casa Branca, na margem esquerda da ribeira da Represa, um pouco abaixo das ruínas do pequeno monumento romano, perto da ponta e estrada 118. Passava ali a via romana, que de Abrantes ia para Alvega, Gavião, Arronches, até Mérida. Ora naquele sítio é a Buraca da Moura, seja uma fenda que não escapa à lenda!
E a lenda conta que naquela Buraca vivia, uma bela moura, naturalmente encantada. Apenas saía de noite, para cantar as suas tristezas. Ora também é voz corrente que naquela Buraca começa um túnel que, passando sob a ribeira, alcança a margem direita da Represa e vai dar a algures, a alguns quilómetros dali. Só que a memória popular perdeu a localização dessa saída e já ninguém se arrisca a fazer o túnel por dentro. Uma vez, um pastor terá dito que ali, junto à Buraca a Moura, lhe desapareceu uma cabra e só deu com ela bastante longe, lembrando-se do túnel. Mas também não deu com a outra saída - ou entrada! (...)"
Fonte: Visor Moutinho, Lendas de Portugal. Diário de Notícias, 2003.